quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

ENTREVISTA: Ana Manssour fala sobre o RP, mercado gaúcho e seus projetos



Eu tive a oportunidade de ter a Professora (Eu vou chamá-la assim sempre) Ana Manssour como minha orientadora. Foi incrível. Foi um período muito intenso, recheado de pesquisas, reflexões, chimarrão e churrasco gaúcho! Conheci, junto com meus amigos de TCC, a sua família e fui recebido com toda a hospitalidade que faz parte de um bom Sulista.

Depois de algum tempo, então, decidi que precisava ter uma entrevista com a Ana para o RP em Questão. Acho que o dia das relações públicas é uma boa data para isso. Pois aqui está. Fico muito feliz de contar com essa excelente profissional também aqui, em meu blog. Manssour é relações públicas, formada pela FAMECOS/PUC-RS e seu mestrado strictu sensu em Administração, com ênfase em Organizações foi feito na EA/PPGA-UFRGS. Lecionou na Faculdade Cenecista N. Sra. Dos Anjos, em Gravataí/RS e SENAC-RS, e Porto Alegre.Hoje é diretora executiva da Pró RP e responsável pelo conteúdo do portal Plena Mulher.

RP em Questão: Como você define o profissional de relações públicas?
- É o profissional capacitado para cuidar da imagem e da reputação das organizações por meio do estabelecimento de relacionamentos sustentáveis entre a empresa e seus públicos de interesse.

RP em Questão: Como foi ser relações públicas no Sul? Quais as peculiaridades do mercado gaúcho?
- Na época trabalhava em uma única empresa, que não tinha uma área específica de
comunicação. Essa experiência foi muito gratificante, pois tive a oportunidade de criar a área do zero que, embora pequena, com apenas quatro pessoas, dava conta do recado, trabalhando desde imprensa e comunicação interna até comunicação institucional e eventos internos. Foi de grande valia para a implantação do sistema de gestão estratégica na empresa, envolvendo todos os funcionários no processo e fazendo a interação com a empresa-mãe do grupo.

Já fazem 6 anos que vim do Rio Grande do Sul, então não tenho mais como avaliar as peculiaridades do mercado gaúcho, uma vez que as coisas mudam, se adaptam e globalizam muito rapidamente. O que é certo, é que existe uma diferença cultural bastante grande não só do mercado, mas das pessoas em geral, da maneira como se relacionam entre si e com produtos e marcas, em relação a outros estados. O gaúcho é afetivo e passional, dá grande valor a amizade, no mesmo nível que às relações familiares, e uma vez que estabelece uma relação afetiva com um produto ou marca tem forte tendência à fidelidade, replicando o tipo de comportamento que demonstra nas relações pessoais. Se descobre desonestidades ou abusos, põe a boca no trombone e vai à luta em busca de justiça e retratação e boicota o produto/marca.


RP em Questão: Você teve uma carreira acadêmica muito admirada e suas dicas são valiosas. O que julga mais importante para quem quer seguir a carreira de RP? E o que diria para quem já está no mercado de trabalho?
- Para seguir a carreira de RP, antes de tudo é preciso ter vocação. O profissional vai enfrentar muitos “ossos” no decorrer da carreira, e se não tiver vocação, amor pela profissão, o caminho vais ser ainda mais árduo e sofrido.

Para quem já está no mercado de trabalho, atuando como Relações Públicas, antes de qualquer outra coisa: parabéns! Tenho acompanhado de longe alunos que se formaram desde 2005, e a partir da minha percepção, posso dizer que do total de cerca de 500 formados, cerca de 10 a 15% estão nessa situação. Os demais, ou atuam em áreas afins como marketing e recursos humanos, ou buscaram outros caminhos. O mercado, infelizmente, ainda não entende o que o profissional de Relações Públicas faz além de eventos e jornais internos, e é comum acabarem contratando profissionais de outras áreas, que não têm a mesma qualificação, para atividades que são de RP, como gestão de marca, de crises e de reputação organizacional, por
exemplo.


Por isso mesmo, faço um chamamento aos profissionais de Relações Públicas que estão atuando na área para que tenham clara consciência de que representam toda a categoria, e que seu trabalho, suas ações, sua imagem pública são fatores primordiais para que as Relações Públicas passem a ser compreendidas e valorizadas pelas empresas e pelo mercado em geral. Dessa forma, estarão colaborando para que outros colegas sejam reconhecidos e tenham oportunidades na área, bem como facilitarão o caminho das próximas gerações de RP. Por consequência, estarão, também, garantindo que o futuro das organizações seja muito mais promissor, equilibrado e sustentável. Ou seja, estaremos, assim, cumprindo com o que eu chamo de “missão máxima das Relações Públicas”, para a qual convergem todos os seus objetivos: Contribuir para um mundo e uma sociedade melhores, mais justos e harmoniosos, por meio da construção de relacionamentos de benefícios recíprocos e equilibrados entre as organizações e seus públicos.

RP em Questão: O que considera uma habilidade imprescindível para o RP?
- Na verdade, é um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que formam um RP competente na profissão, que defino em três pilares:

Conhecimentos (formação)
• Estudos sobre a comunicação, cultura e comportamento de pessoas, grupos e organizações
• Técnicas e instrumentos de comunicação
• Ferramentas de auditoria
• Ferramentas de análise de cenário
• Análise e interpretação de informações tangíveis
• Ferramentas de planejamento
• Técnicas de gestão de processos e pessoas
• Língua portuguesa (ortografia, gramática, estilos)

Habilidades (natas e/ou desenvolvidas)
• Captação, análise e interpretação de informações intangíveis
• Visão e compreensão abrangente e sistêmica do negócio da organização
• Encadeamento lógico de raciocínio
• Aplicação do conhecimento na prática
• Liderança positiva
• Estimular, aceitar e desenvolver inovações
• Rápida adaptação a novas realidades
• Manutenção do entusiasmo e perseverança
• Auto-análise e humildade para reconhecer falhas e para se manter em permanente
aprendizado
• Estabelecer relacionamentos interpessoais e formar network
• Comunicação oral e escrita

Atitudes (características de personalidade ou treinadas)
• Iniciativa e ousadia
• Firmeza de caráter
• Autodisciplina
• Equilíbrio entre razão e intuição
• Foco em resultados

RP em Questão: Como surgiu a Pró.RP?
- Por 5 anos me dediquei exclusivamente ao magistério superior, pois a atividade, quando se tem como objetivo ser um professor que de fato estimule o aprendizado, respeite prazos e contribua com materiais atualizados e avaliações bem elaboradas, exige 100% do tempo do profissional, muito mais quando se fala em turmas que contam com 70, 90 ou mais alunos em sala. Por mais que eu goste demais de ser professora, houve um momento em que a profissional precisava voltar a por “a mão na massa”, relacionar-se mais de perto com o mercado, atualizar-se e ler sobre negócios e a realidade em permanente mudança das organizações, e o magistério infelizmente não permitia fazer isso simultaneamente.

Fiz então a transferência da minha consultoria – que estava em estado de hibernação – de Porto Alegre para cá e rebatizei-a com o mesmo nome do blog que havia criado para compartilhar informações com os alunos: Pró.RP, ou seja em nome, ou “a favor” das Relações Públicas.

RP em Questão: A agência tem um modo diferente de tratar a comunicação corporativa. A filosofia da agência fala em relacionamentos sustentáveis. Como você enxerga a sustentabilidade no trabalho das relações públicas?
- Antes de qualquer outra coisa é bom fazer um esclarecimento. Existe uma má compreensão do termo sustentabilidade. A maioria das pessoas e empresas entende unicamente como referente à natureza, ao meio-ambiente. Entretanto, se prestarmos atenção ao princípio do tripé da sustentabilidade, sabe-se que atitudes consideradas de fato sustentáveis precisam ser economicamente viáveis, socialmente justas e ambientalmente responsáveis. Ou seja, no mínimo essas três variáveis precisam ser atendidas. Há outros conceitos que prevêem mais variáveis para a verdadeira sustentabilidade.

Quando se fala em relações públicas, cuja principal função é a “construção de relacionamentos de benefícios recíprocos e equilibrados entre as organizações e seus públicos”, não é difícil perceber que para essa construção ter sucesso ela precisa, justamente, estar baseada no tripé da sustentabilidade. Quando as relações se estabelecem com justiça para todos os envolvidos; sem afetar negativamente o equilíbrio do meio-ambiente ou mesmo aprimorando-o; e sem prejudicar economicamente nenhum dos lados, ou mesmo promovendo ganhos mútuos; cria-se um relacionamento harmonioso e estável que tende a se perenizar. Esse é o caminho mais certo – embora realmente demande mais trabalho e tenha um trajeto mais longo – para que as organizações alcancem a tão sonhada “fidelidade do cliente”. Só é fiel ao parceiro quem confia que as atitudes dele são sempre justas, viáveis e responsáveis. E essa confiança só se estabelece ao longo do tempo, pela confirmação do “bom caráter” da organização a cada nova atitude. É assim que acontece entre amigos, casais, familiares e as relações com as organizações são reproduções da vida pessoal.

As organizações são feitas de pessoas, com pessoas e para pessoas, portanto os relacionamentos que estabelecem com todos os públicos seguem os mesmos princípios básicos de todas as relações humanas. E o ser humano em seu estado puro, não-deturpado, não corrompido, é, assim como os demais seres vivos, naturalmente parte de um planeta que tem na sustentabilidade a base da sua perpetuidade e da sua forma de viver.

RP em Questão: Em relação a sustentabilidade das empresas, elas têm cumprido com o dever de casa, ou o discurso ainda está longe da prática?
- Bem, a partir do que falei antes quando à compreensão do que é sustentabilidade, pode-se dizer que a maioria esmagadora das empresas ainda está engatinhando nessa questão. Algumas – poucas – se destacam por já terem conseguido absorver o conceito e introjetar nas mínimas atitudes diárias internas e externas as premissas, sem, inclusive, se tornarem fanáticas, porque o fanatismo leva necessariamente à cegueira em relação ao equilíbrio das três pernas do tripé.

RP em Questão: E o Plena Mulher? O que te levou a criar um portal dedicado a mulheres maduras?
- O portal Plena Mulher nasceu da convergência de três fatores: a “iluminação”, a oportunidade, e a vontade.

A iluminação é a fase em que se começa a observar e até sentir na pele algumas falhas, lacunas em determinadas áreas ou mercados. Foi o que aconteceu quando comecei a trazer à consciência que eu mesma sentia falta de um veículo de comunicação que falasse assuntos do meu interesse, da minha faixa etária, mulheres que valorizam a própria história pessoal e profissional trilhada e não querem mais saber de reportagens sobre “como agarrar o seu homem”, ou “saiba como rejuvenescer 20 anos”, ou “30 posições simplificadas do Kamasutra”! rs

A oportunidade é quando você verifica que há, de fato, um forte público potencial – além de você mesmo – interessado no produto/serviço que você começa a pensar em oferecer. Elaborei e apliquei uma pesquisa com mulheres majoritária mente da faixa dos 40 anos em diante (82%), e o resultado foi determinante. 68,7% das mulheres pesquisadas respondeu que acompanharia com regularidade um veículo que atendesse aos seus interesses e 31,63% que acompanhariam eventualmente. Nenhuma respondeu de forma negativa. E quanto ao meio de comunicação a ser utilizado para o veículo, houve um interessante empate na preferência entre Revista Impressa e Site na Internet, contrariando o pressuposto inicial de que a Revista Impressa seria o primeiro lugar disparado.

E a vontade, ou iniciativa, é quando você une a iluminação com a oportunidade e vai à luta, formatando o produto ou serviço e colocando-o no mercado, enfrentando as dificuldades naturais que uma inovação encontra para entrar em cena, especialmente quando há players de grande porte já estabelecidos como concorrentes indiretos, e um preconceito muito grande em relação ao envelhecimento feminino tanto por parte da sociedade quanto pelo mercado, que insiste em desenvolver, divulgar e anunciar produtos e serviços para os jovens e pessoas de, no máximo, 35 anos.

Aliás, você já notou que a expectativa da sociedade, do mercado de trabalho e das empresas de bem de consumo é que por volta dos 40 anos as mulheres desapareçam? Ou, por outro ponto de vista, que se dediquem à família, ao artesanato, à culinária saudável, às intervenções de rejuvenescimento físico, às fofocas sobre a vida de personalidades e a se preocupar com as desgraças que a enopausa e o climatério podem trazer para a sua vida? E essa expectativa está altamente resistente a todas as pesquisas e levantamentos que são periodicamente feitos e que apontam o poder econômico, de decisão e de consumo da mulher madura, tanto como indivíduo quanto como membro da família e da sociedade.

Um exemplo disso foi quando, ao conversar com uma gerente de marketing de uma rede de shopping centers – ela própria uma mulher madura – recebemos a informação de que os lojistas não querem que as suas marcas sejam ligadas à imagem de mulheres não-jovens! Interessante, não? Ainda mais se pensarmos que quem tem mais condições, maior poder econômico e pode comprar mais e melhor são justamente essas “mulheres não-jovens” desdenhadas pelos lojistas, e que também são quem dá a mesada para as filhas jovens poderem fazer suas compras, ou financiam-lhes o dinheiro que falta para aquisições de maior porte... Se isso não é preconceito, então não sei como se chama.


RP em Questão: E o portal tem sido bem aceito?
- Temos tido uma excelente receptividade por parte do nosso público-alvo, inclusive com algumas histórias emocionantes de mulheres que tomaram decisões importantes em suas vidas a partir de matérias e reportagens lidas no Plena Mulher. Surpreendentemente, temos também muitas mulheres mais jovens, já a partir de 23, 25 anos, que leem com frequência, comentam e participam das promoções do portal. Outro público que nos acompanha e seguidamente nos faz consultas são os homens a partir dos 40 anos e alguns até mais jovens. Foi quando percebemos que “ser maduro” não é necessariamente uma questão de idade, mas sim de mentalidade, educação, formação, de dar valor ao que realmente importa. Por outro lado, ainda não são muitas as empresas que se fazem presentes no portal Plena Mulher, seja para anúncios ou promoções. Algumas, por terem produtos ou serviços com características claramente voltadas para mulheres maduras já têm sido nossas parceiras, como a Piccadilly, Editora Prumo, Maturi, BioLab/Caffe Green, Contours Academia para Mulheres, Viva Raiz e Spa Sorocaba, e outras que começam a apostar nesse segmento.

Nos últimos meses, entretanto, temos sido bem mais abordados com solicitações de tabelas de preços, o que demonstra que há um crescimento de consciência quanto à importância desse público específico e bem segmentado que compõe a nossa audiência.

RP em Questão: Como vê a comunicação digital? Quais as soluções que estão sendo apresentadas para os clientes? Como tem sido a aceitação?
- Cresce diariamente o poder de influência da comunicação nas redes sociais e a importância de saber utilizá-las para alcançar os públicos-alvos corretamente. O que se observa entretanto, é que ainda há falta de compreensão quanto à necessidade de selecionar os canais certos, as redes a serem utilizadas, porque elas têm características específicas e comportam comunidades com diferentes perfis. Não adianta, por exemplo, fazer uma campanha no Twitter, dependendo do público que se tem em mente, ou do tipo de produto ou serviço que está sendo divulgado, ou do tempo de veiculação pretendida. O difícil é justamente educar o cliente no sentido de compreender que é preciso segmentar bem, direcionar bem a comunicação para que se obtenham os melhores resultados possíveis – e não sair atirando para todos os lados, desperdiçando munição e calibre em diferentes alvos.

RP em Questão: E quais são os próximos passos da Relações Públicas Ana Manssour?
- Pois é... Eu sou uma inquieta de plantão, tenho o vírus da inovação eterna! (rs) Ou, como diriam os mais antigos, tenho “bicho carpinteiro”, estou sempre inventando ou me envolvendo em coisas novas. Estou com planos, um deles é oferecer um novo serviço no leque da consultoria, ainda inexistente no mercado, voltado para quem utiliza e monitora as redes sociais – estou estudando e desenvolvendo a metodologia. Outro, é um empreendimento, em outra área, voltado para um novo padrão de trabalho que proporciona mobilidade e economia para executivos e profissionais autônomos, com base no tripé da sustentabilidade. Um terceiro plano é concretizar um antigo projeto, a publicação de um livro sobre Relações Públicas que não tenha as características comuns às obras técnico-científicas.

Cada um desses planos tem objetivos, prioridades, prazos e parceiros diferentes, mas estão todos em pauta, e tenho tentado distribuir proporcionalmente meu tempo entre eles, sem deixar de atender o trabalho do portal Plena Mulher e da consultoria. Confesso que está cada vez mais difícil dar conta de tudo, mas, este ano resolvi sair do armário e assumir: - Sim, eu sou workaholic, perfeccionista, e o trabalho me faz feliz!

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